A Lei Anticorrupção é um dos mais importantes instrumentos para o combate a práticas ilegais envolvendo empresas e agentes públicos no Brasil. Além de estabelecer as atitudes passíveis de punição e as possíveis punições, o documento é um marco importante para o estabelecimento e consolidação no compliance dentro das empresas.
Neste post, veja o que é a Lei Anticorrupção, conheça seus objetivos, os atos lesivos previstos e as penas aplicáveis, e saiba qual é a importância do compliance. Acompanhe!
O que é a Lei Anticorrupção?
A Lei nº 12.846 de 1º de agosto de 2013, mais conhecida como Lei Anticorrupção, é uma das principais inovações no ordenamento jurídico brasileiro.
É um dos recursos mais importantes para o combate a atos ilícitos e antiéticos cometidos por empresas contra a administração pública, a exemplo de fraudes em licitações, no cumprimento de contratos, pagamento de propinas, entre outros.
O documento institui medidas de combate à corrupção, prevendo a responsabilização das pessoas jurídicas envolvidas nos atos lesivos e a recuperação de potenciais danos causados ao poder público.
De acordo com a lei, as empresas que incorrerem em tais atos podem sofrer punições severas, tanto no aspecto civil quanto administrativo.
Para isso, a legislação prevê a responsabilidade objetiva das instituições, ou seja, não há a necessidade de realização de prova de dolo, culpa ou má-fé da empresa referentes aos atos lesivos para que ela seja responsabilizada.
A abrangência da Lei Anticorrupção é definida no art. 1º:
“Aplica-se o disposto nesta Lei às sociedades empresárias e às sociedades simples, personificadas ou não, independentemente da forma de organização ou modelo societário adotado, bem como a quaisquer fundações, associações de entidades ou pessoas, ou sociedades estrangeiras, que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro, constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente”.
Contexto da Lei Anticorrupção
A Constituição Federal de 1988 estabelece em seu art. 37, § 4º, que:
“Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”.
No entanto, até o momento da criação da Lei Anticorrupção, no Brasil esse entendimento não era suficiente para combater as práticas antiéticas nas empresas de forma eficaz.
Não à toa, nos anos subsequentes à CF foram criados diversos mecanismos e normas, mas com resultados pouco satisfatórios.
Foi então que, em fevereiro de 2010, a Controladoria Geral da União (CGU) enviou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 6.826, que viria a se tornar a Lei Anticorrupção.
Vale lembrar que, na época, o Brasil já vivia em contexto de forte discussão sobre casos de corrupção envolvendo a relação entre agentes públicos e pessoas jurídicas.
Além disso, o País participou ao longo dos primeiros anos do novo milênio de encontros e convenções mundiais sobre o combate à corrupção, sendo um dos últimos a criar regramentos contra esse tipo de prática.
Embora o PL tenha sido aprovado pela Câmara dos Deputados em 2011, foi somente em julho de 2013 que a nova lei foi aprovada no Senado Federal, muito em função da pressão em virtude dos movimentos sociais que tomaram as ruas no mês anterior daquele ano. A Lei nº 12.846 entrou em vigor em janeiro de 2014.
A Lei Anticorrupção foi inspirada em outras legislações internacionais consideradas bastante rígidas no combate à corrupção. Os principais exemplos são o Foreign Corrupt Practices Act (FCPA) dos Estados Unidos, e o UK Bribery Act, do Reino Unido.
Objetivo da Lei Anticorrupção
O objetivo principal da Lei Anticorrupção é criminalizar e punir severamente as pessoas jurídicas que cometerem atos lesivos contra a administração pública e promover a recuperação dos danos causados.
Mas não é só isso: a legislação também tem a finalidade de reduzir a cultura da corrupção no País, criando um ambiente de coação à noção de que é possível beneficiar-se ilicitamente sem que haja maiores consequências.
Assim, a Lei nº 12.846 pode ser entendida como uma garantia de que as empresas envolvidas em corrupção serão objetivamente responsabilizadas e responderão – civil e administrativamente, por seus atos, o que envolve a aplicação de sanções administrativas e financeiras.
Importante notar ainda que, como estabelece o art. 3º, a “responsabilização da pessoa jurídica não exclui a responsabilidade individual de seus dirigentes ou administradores ou de qualquer pessoa natural, autora, coautora ou partícipe do ato ilícito”.
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Atos lesivos à administração pública, nacional ou estrangeira
A Lei Anticorrupção estabelece que são lesivos todos os atos praticados por pessoas jurídicas que prejudiquem o patrimônio público nacional ou estrangeiro, que vão contra os princípios da administração pública ou que firam os compromissos internacionais dos quais o Brasil é signatário.
Importante notar que, em seu art. 5º, a legislação estabelece que:
“§ 1º Considera-se administração pública estrangeira os órgãos e entidades estatais ou representações diplomáticas de país estrangeiro, de qualquer nível ou esfera de governo, bem como as pessoas jurídicas controladas, direta ou indiretamente, pelo poder público de país estrangeiro.
§ 2º Para os efeitos desta Lei, equiparam-se à administração pública estrangeira as organizações públicas internacionais.
§ 3º Considera-se agente público estrangeiro, para os fins desta Lei, quem, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, exerça cargo, emprego ou função pública em órgãos, entidades estatais ou em representações diplomáticas de país estrangeiro, assim como em pessoas jurídicas controladas, direta ou indiretamente, pelo poder público de país estrangeiro ou em organizações públicas internacionais”.
Ações passíveis de punição
Em seu art. 5º, a Lei Anticorrupção elenca um rol de condutas que, se praticadas por pessoas jurídicas, podem ser enquadradas como atos lesivos contra a administração pública e, portanto, passíveis de punições e sanções.
São elas:
- Prometer, oferecer ou dar vantagem indevida a agente público;
- Financiar, custear ou patrocinar a prática de atos ilícitos;
- Utilizar de intermediário para dissimular os interesses ou a identificação dos beneficiários de atos ilícitos;
- Fraudar o caráter competitivo de processo licitatório público;
- Fraudar a realização de processo licitatório público;
- Afastar ou tentar afastar outros licitantes, por meio de fraude ou oferecimento de vantagem;
- Fraudar licitações ou contratos;
- Criar pessoa jurídica para participar de licitação pública;
- Obter vantagem com a modificação ou prorrogação de contratações com a administração pública, sem autorização da Lei.
- Manipular ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos;
- Dificultar ou interferir na atuação de órgãos fiscalizadores e agentes públicos.
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Penas aplicáveis com base na Lei Anticorrupção
Sanções administrativas
Referem-se às sanções que serão aplicadas às pessoas jurídicas consideradas responsáveis pelos atos lesivos previstos. Nesse âmbito, a lei prevê, em seu art. 6º, duas formas de penalidades: multas e a publicação da decisão condenatória.
Em relação às multas, o valor pode variar de 0,1% a 20% do último faturamento bruto da empresa.
No entanto, é preciso destacar que esse valor nunca poderá ser inferior à vantagem recebida, nos casos em que for possível estimá-la. Caso isso não seja possível, a multa poderá variar de R$ 6 mil a R$ 60 milhões.
Já no caso da publicação da decisão condenatória, a lei estabelece que ela deverá ser feita em veículos de comunicação de grande circulação na região em que a infração foi cometida e às custas da própria pessoa jurídica infratora.
O art. 7º prevê que as sanções administrativas serão definidas de acordo com uma série de critérios. São eles:
“I – a gravidade da infração;
II – a vantagem auferida ou pretendida pelo infrator;
III – a consumação ou não da infração;
IV – o grau de lesão ou perigo de lesão;
V – o efeito negativo produzido pela infração;
VI – a situação econômica do infrator;
VII – a cooperação da pessoa jurídica para a apuração das infrações;
VIII – a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica;
IX – o valor dos contratos mantidos pela pessoa jurídica com o órgão ou entidade pública lesados”.
Sanções civis
A Lei Anticorrupção também prevê a responsabilização dos infratores na esfera judicial. Segunda a legislação, União, estados e municípios devem ajuizar ações com o objetivo de aplicar as sanções previstas no art. 19 do documento. São elas:
- Perda de bens, direito e valores que representam a vantagem obtida da infração;
- Suspensão das atividades da empresa;
- Dissolução da pessoa jurídica;
- Proibição de receber incentivos, subsídios, doações e empréstimos de órgãos e instituições financeiras públicas por entre um e cinco anos.
Importante notar que essas sanções poderão ser aplicadas de forma isolada ou cumulativa. A lei prevê ainda que o órgão público responsável pela representação poderá requerer bens, direitos e valores do infrator para garantir o pagamento da multa ou reparação do dano causado.
Acordo de Leniência
A Lei nº 12.846 também define a possibilidade de acordos de leniência entre a autoridade máxima de cada órgão (geralmente, CGU e TCU) e as pessoas jurídicas infratoras que colaborarem de forma efetiva com as investigações.
Para essa colaboração, porém, existem alguns condicionantes. Segundo o art. 16, ela deve resultar na identificação dos demais envolvidos na infração e na obtenção de informações e documentos que comprovem o ato ilícito em investigação.
Quando a empresa colabora efetivamente com as autoridades, o acordo de leniência prevê benefícios a ela, sobretudo na forma de redução das penalidades previstas.
O documento prevê que a celebração do acordo isentará a empresa das sanções previstas nos artigos 6º e 19 e reduzirá em até dois terços o valor da multa que seria aplicada.
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Importância do Compliance para evitar sanções da Lei Anticorrupção
Ao falar da importância do compliance no contexto da Lei Anticorrupção, devemos retomar um dos pontos levantados pelo art. 7º do documento, que estabelece as condições que influenciarão na gravidade das sanções. Destaca-se:
“VIII – a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica”.
Assim, de acordo com a lei, a implantação de programas de compliance se torna peça fundamental na estrutura da empresa, uma vez que pode atenuar as penalidades previstas no documento.
Vale notar, no entanto, que os programas de compliance, bem como as políticas de governança corporativa, não devem ser instaurados apenas como forma de reduzir sanções legais.
Pelo contrário: ao investir em práticas e procedimentos pautados na ética, na transparência, na integridade e na conformidade com a legislação, as empresas conseguem prevenir – e não apenas combater – práticas ilícitas.
Ferramentas e recursos como Código de Conduta, canais de denúncia, treinamentos de colaboradores e a divulgação dos valores e da cultura ética da empresa dificultam a ocorrência de atos lesivos e favorecem seu monitoramento e controle.
Uma vez que a Lei Anticorrupção não se aprofunda no tema, em 2015 foi publicado o Decreto nº 8.420 que regulamenta a lei e, entre outras medidas, estabelece as bases para a criação de programas de integridade nas empresas.
Para isso, foram definidos parâmetros que devem constar no programa e que serão avaliados no caso de envolvimento da pessoa jurídica com práticas ilícitas.
São eles:
- Comprometimento da alta direção da pessoa jurídica;
- Padrões de conduta, código de ética, políticas e procedimentos de integridade, aplicáveis a todos os empregados e administradores e, quando necessário, a terceiros;
- Treinamentos periódicos;
- Análise periódica de riscos;
- Registros contábeis completos e precisos;
- Controles internos que assegurem a confiabilidade de relatórios e demonstrações financeiros;
- Procedimentos específicos para prevenir fraudes e ilícitos no âmbito de processos licitatórios;
- Independência, estrutura e autoridade da instância interna responsável pela aplicação do programa de integridade;
- Canais de denúncia de irregularidades, abertos e amplamente divulgados e mecanismos destinados à proteção de denunciantes de boa-fé;
- Medidas disciplinares em caso de violação do programa de integridade;
- Procedimentos que garantam a interrupção das irregularidades detectadas;
- Diligências para contratação de terceiros;
- Verificação, durante os processos de fusões, aquisições e reestruturações societárias, do cometimento de irregularidades;
- Monitoramento contínuo do programa de integridade;
- Transparência da pessoa jurídica quanto a doações para candidatos e partidos políticos.
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Conclusão
O compliance é um dos assuntos mais críticos no mundo corporativo de hoje. Seguindo uma série de movimentos e acordos globais e na esteira das pressões da sociedade e do mercado, a Lei Anticorrupção foi criada para trazer mais lisura às relações entre pessoas jurídicas e a administração pública.
O documento é um importante marco no combate à corrupção no Brasil e, em conjunto com outras legislações posteriores, preencheu uma lacuna importante no ordenamento jurídico brasileiro, endurecendo o controle e as punições para tais atos.
Cabe às empresas se adequarem ao que prevê a lei, implantando programas de integridade e disseminando a ética e a transparência por todos seus setores e processos.
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